sexta-feira, 9 de maio de 2008

Tinha séculos que não terminava um texto, pelo menos comecei alguns. Este ainda precisa de ser revisto, e muito provavelmente mudado. Hasta!


Outro dia eu tava lá na Savassi. Acho que era uma sexta ou um dia desses que todo mundo resolve se exibir naquela praça. De um lado, fica aquele bando de pirralho doido, cada um com uma roupa mais estranha que a outra. Do outro lado ficam os grã-finos, que devem achar gostoso cheirar fumaça de carro e misturar música com o barulho do lado de fora, só pode. O tal bar em que eles ficam tem um tanto de livro também... Sei lá pra quê.
Mas eu não to nem aí, também. Eles são uns filhos da puta por gastar aquela dinheirama toda com comida pouca e estranha, enquanto eles bem que podiam comprar pão pra família deles e pra mais umas 10 das nossas. Que se foda, faz tempo que desisti de reclamar, ninguém ouve a gente, deve ser porque enquanto a gente fala o ronco da barriga é mais alto que a voz. Além do mais, é tempo perdido, menos latinha que dá pra pegar deles. Se tem uma coisa boa que eles fazem é beber essas coisas nojentas com gás igual camelo bebe água, me dão dinheiro fácil, assim. Tomara que nunca descubram a cachaça, se não param de me sustentar! Eu – ao contrário deles – tenho mais com o que me preocupar. O preço de tudo aumenta, minha família aumenta, mas emprego que é bom ninguém acha. Outro dia deu na TV que tinha advogado na fila pra virar gari. Eu queria ter virado advogada, se meus pais não tivessem me mandado trabalhar de empregada antes de terminar a escola. Eles falavam que diploma não ajuda a encher barriga, e taí a prova. Quanto mais diploma, mais prazos ce tem que cumprir em menos tempo – se ce conseguir emprego, né - pode até ganhar uma dinheirama danada, mas depois vai estar de saco tão cheio que nem vai aproveitar nada... Eu sou pobre, mas pelo menos sou livre. Meu único prazo é minha fome. Então, era exatamente isso que eu tava contando, eu tava com fome. E era uma sexta. E eu tava na savassi, na parte dos ricos. Eu gosto de ir lá, vou nas mesas pegar as latinhas e ver se eles me dão uns trocados. Na verdade, eles SEMPRE me dão uns trocados. Nas sextas, me divirto igual eles. Mais que eles. Nas noites frias, me esquenta olhar bem forte praqueles olhos gelados e praquela felicidade fingida deles. Me esquenta ver que eles se incomodam com a minha presença, não gostam do que não é igual a eles. E isso me esquenta porque significa que eles não querem que eu seja igual a eles, quase que desejam serem livres como eu. E, por isso, se envergonham quando eu chego e me sustentam. É o único jeito que eles acham de ter uma minúscula participação na vida que eles queriam levar – a minha vida.
Uhn, já tava me perdendo de novo. Eu tava na savassi, no bar dos ricos que tem livros, e era uma sexta, e eu tava catando latinhas e pedindo dinheiro. Tinha duas meninas numa mesa mais longe da confusão, num cantinho mais perto das plantas da praça. Elas não olharam pra mim com cara de quem tem pena da minha vida – só porque eu não tenho luxo, mas lixo - mas mais pena ainda da vida delas (e é assim que me olham normalmente). Elas olharam para mim como quem gostaria que eu tivesse as mesmas coisas que elas, sem receber nada em troca, como se fossem felizes com a própria vida, de verdade. Eu achei isso estranho demais, mas fiquei feliz – ia ganhar mais dinheiro ainda, quem sabe dava pra fazer uma surpresa pras minhas filhas, comprar presunto pra elas! Maaas nããão, ser humano não presta mesmo. Sabe quanto me deram? Necas. Mas tudo bem, fui atrás dos idiotas normais de sempre. Depois de umas duas ou três mesas, adivinha quem me aparece? Uma das duas meninas, perguntando se eu tava com fome e queria comer. Bom, fome a gente sempre tem. O ruim de oferecerem comida é que a gente nunca pode escolher o que quer, nem quando quer. Mas eu tava curiosa mesmo pra saber como que era a comida cara daquele lugar, e porque que era cara, e aceitei. Foi legal demais, fiquei sentada no banco da praça esperando, todo mundo me olhando. Odeio quando o povo me olha como se eu fosse uma aberração. Comecei a xingar aquele povo todo, a gritar, só pra eles terem motivo pra me olhar daquele jeito. É que eu tenho dó de povo ignorante metido a sabido, aí gosto de dar razão pra eles de vez em quando.
Esperei pra caralho pela comida, e me chega um misto quente igual o das lanchonetes de esquina fedorenta no centro, SEM CATCHUP!