quinta-feira, 9 de setembro de 2010

escrevo poesia no tempo que dá
entre uma mordida
e um gole de chá

sábado, 14 de agosto de 2010

..................................... alvorada
.................................................................................................... dia
................................................................. noite
.,....................................................................................................... madrugada


tudo se repete
e a vida segue

desenfrada

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Diálogo

- É verdade que você fala japonês?
- Falo, mas só um pouquinho. Preciso estudar mais.
- E como se diz "amor"?
- "Ai".
- Mas não é assim em todas as línguas?

terça-feira, 6 de julho de 2010

Frida

calo no sapato
acadêmico

Frida
Kahlo-me.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

de todas as saudades que me doem
a mais cruel
eu nem sei de onde vem.

domingo, 6 de junho de 2010

Caio Fernando Abreu disse que "Amor mata, amor mata, amor mata". Mentira. Amor passa, amor passa, amor passa. Antes matasse.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Crônica de fim de primavera

Desde o início, pra Jui, mo chara.

Ei, só tô te escrevendo pra dizer que estou feliz. Pra você não ficar preocupada como ficou aquele dia. É que a gente acha demais que ficar até tarde de noite no computador trablhando não faz mal, que no dia seguinte vai estar tudo bem. É que a gente pensa demais que pode viver como se não fosse com a gente, como se não tivesse nada a ver com isso. E continuaria pensando que viver assim também pode ser felicidade, se não existissem esses dias de fim de primavera. Esses em que a gente vive como se fosse assunto nosso. Esses em que a gente não vai à aula ou ao trabalho para fazer teatro, e vê mais cedo a luz do dia que aparece pela primeira vez em algumas semanas. Aí a gente entende que existe plenitude, e se sente o super homem do Nietzsche em alegria. Se permite correr na rua quanto e como quer, e entrar até nas lojas que não têm nada a ver, e de repente se vê no alto do arco do viaduto de Sta. Tereza, em plena luz do dia, e se acha dono do mundo.

Hoje eu iria a pé do Floresta até Nova Lima, e já fiz metade do caminho. É que me sinto vontade de Schopenhauer e todo mundo é igual a mim. Hoje realizo a vontade toda e ela se desfaz, e o mundo todo é radiante como eu.

Não tenho coragem de ouvir minhas músicas e ligo o rádio, quero cantar e só na minha língua. Até os cafés que tanto amo para escrever me parecem repugnantes com sua luz baixa e cheiro de gente que não descansa. Hoje quero receber luz e achar que crio vento quando corro e meus cabelos parecem rir.

Quero também alguém com quem eu possa compartilhar tudo isso, mas não tem...

Todos meus amigos estão longe: pro norte, pro sul, pra dentro. Dentro de si ou de preocupações... mas tudo bem. Hoje posso reinventar vocês todos e compartilhamos do mesmo desvario, entre nós não há mais espaço que num abraço.

Amo vocês, e lembrem-se sempre que amo vocês como só é possível em dias como esse. Mesmo nos outros dias, mesmo quando e se voltar a achar que se pode viver de outro jeito.

sejam felizes também, queridos.

sábado, 10 de abril de 2010

[in:] Finito


Primeira de uma série de transcriações de poesias italianas trazidas para o contexto belo-horizontino.

Sempre caro me foi este simples arco

e não estes prédios, que de tanto céu
e da última serra a visão bloqueiam.
Mas sentada enquadrando as paisagens
que escapam deles, e além-homens
silêncios, e profundíssima paz
eu tento inventar, mas logo
o coração meu se descompassa. E como o trem
ouço rugir sob este viaduto, eu aquele
impossível silêncio a esta fúria
vou comparando: e me foge o eterno,
e os quietos tempos, e o presente
fica, e o desespero dele. Assim entre
esta agitação se perde o pensar meu:
e o naufragar me seria doce sob estes trilhos.



Infinito
Sempre caro mi fu quest'ermo colle,
e questa siepe, che da tanta parte
dell'ultimo orizzonte il guardo esclude
Ma sedendo e mirando, interminati
spazi di là da quella, e sovrumani
silenzi, e profondissima quïete
io nel pensier mi fingo, ove per poco
il cor non si spaura. E come il vento
odo stormir tra queste piante, io quello
infinito silenzio a questa voce
vo comparando: e mi sovvien l'eterno,
e le morte stagioni, e la presente
e viva, e il suon di lei. Così tra questa
immensità s'annega il pensier mio:
e il naufragar m'è dolce in questo mare

Giacomo Leopardi


porque ele se mataria pulando do arco do viaduto de Sta. Tereza se morasse na BH do século XXI, certeza.

quinta-feira, 25 de março de 2010

vida à toa

um verso de dia
de noite uma melodia

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Caio Fernando Abreu

Esta é a primeira versão de uma biografia curtinha que fiz para a revista Carpe Diem no ano passado. Apesar de ter publicado outra versão, prefiro esta, que posto hoje, dia em que se completam 14 anos de sua morte.

Vai passar, tu sabes que vai passar. Talvez não amanhã, mas dentro de uma semana, um mês ou dois, quem sabe?
Sua vida passou. Mas as palavras de Caio Fernando Abreu, depois desses meses todos, que agora já viraram mais de década - não passaram. E não vão, ora sutis, ora pesadas, mas tão belas que sabem ser.

Caio nasceu em 1948 no interior do RS e se mudou, jovem, para Porto Alegre, onde cursou Letras e Artes Cênicas, sem concluir nenhuma delas, preferia passar pelas coisas como num vôo, num mergulho sem método, mas nem por isso menos alto e profundo.¹ Foram estas, no entanto, as duas direções que tomou na vida. Trabalhou como jornalista algumas vezes, mas não gostava da pressão nem da rotina e, quando pôde, viveu apenas de seus contos (publicados sempre em coletâneas que seguiam um fluxo temático) e romances de ficção. Quanto ao teatro, que amava, escreveu poucas peças, mas sua obra literária, por si só muito teatral, foi inspiração para muitas.

Sim, existir é incompreensível e excitante. As vezes que tentei morrer foi por não poder suportar a maravilha de estar vivo e de ter escolhido ser eu mesmo e fazer aquilo que eu gosto - mesmo que muitos não compreendam ou não aceitem. Assumiu tudo o que fez ou escreveu, encarando as escolhas como escolhas apenas, sem forçar o choque. Inclusive a homossexualidade, que influenciou grande parte de sua literatura (mas não limitou-a, escreveu sobre pessoas, de todos os feitios). Só que homossexualidade não existe, nunca existiu. Existe sexualidade - voltada para um objeto qualquer de desejo. Que pode ou não ter genitália igual, e isso é detalhe. Mas não determina maior ou menor grau de moral ou integridade. Caio F., como é chamado por intelectuais (que às vezes completam o trocadilho, “o primo da Cristiane F.”), chocava, sim, mas por retratar, crua – mas não friamente - aquela geração que, depois da falha da contra-cultura, viu a falência dos seus ideais e sentia-se perdida, fugia através do álcool, das drogas, do sexo. Colhemos cogumelos pelos montes e sabemos que o mundo não vale a nossa lucidez. E criticava, muito. A mania que as pessoas têm de só colocar a felicidade no fim da vida, depois de terem ganhado dinheiro, e de enclausurarem as escolhas dentro de um padrão, por exemplo. É fácil, magro, tu desdobra numa boa: primeiro procura apartamento, depois trabalho, depois escola, depois, se sobrar tempo, amor. Criticou a ditadura, foi perseguido pelo DOPS e refugiou-se na casa de campo de Hilda Hilst, depois na Europa, passando a maior parte do tempo na França e na Inglaterra.

Meus heróis morreram de overdose, meus inimigos estão no poder. A frase de Cazuza bem poderia estar em um de seus contos: fazia sempre referências e, muitas vezes, reverências às artes. Música e cinema, principalmente. Muitas vezes, era autobiográfico. Permitia-se apenas esse medo: o de estar sozinho. Teve muitos amigos e amou muito, mas os amores não costumavam dar certo. Teria mesmo chegado ao ponto de dizer nutro? Teria, teria sim, teria dito nutro & relacionamento & rompimento & afeto, teria dito também estima & consideração & mais alto apreço e toda essa merda educada que as pessoas costumam dizer para colorir a indiferença quando o coração ficou inteiramente gelado. Daí, talvez, o seu sofrimento, talvez daí a desilusão, a melancolia que acompanha seus textos. Justamente por isto, talvez, mais tocantes. Uma vez me disseram que eu jamais amaria dum jeito que “desse certo”, caso contrário deixaria de escrever. Pode ser. Pequenas magias. E ele amava, talvez por ter sido virginiano, essas miudezas mágicas. Como os encontros. Num deserto de almas também desertas, uma alma especial reconhece de imediato a outra.

Essa ternura bruta que destrói por excesso inábil de amor. Caio disse que amor matava. Era frágil, sensível, mas ao mesmo tempo pungente. Talvez por isso tenha merecido o apelido de “Ney Matogrosso da literatura brasileira". No começo dos anos '90, contraiu AIDS – a doença do amor, e voltou ao Brasil para realizar um de seus sonhos – ser um jardineiro. Amor mata, amor mata, amor mata. Morreu de amor.

¹Luiz Arthur Nunes, prefácio ao "Teatro Completo" de Caio Fernando Abreu.
Todas as outras citações são de Caio.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Bahia

quatro paredes e um teto
só mais um quarto no mundo

durmo na rede ao aberto
prefiro ter meu quarto de mundo

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

um dia volto a fazer teatro.
um dia faço circo.
sapateado.
balé moderno.
um dia vou ser feliz.

mas ainda não,
que não há tempo.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

receber amor
de quem não se espera
de quem mais esperas -
esperar

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Dessas coisas que a gente tem que escrever pra escola...


Mirou-se no espelho. O seu primeiro olhar, afável, bastava para que sentisse dilacerar, sob a roupa esgarçada de dormir, aquele corpo murcho. Outrora ardentes, seus olhos, assim como seu corpo, estiveram entre os mais cobiçados de Paris. Homens e mulheres procuravam-na e, hábil, vestia para cada um a faceta mais adequada. Ora relutante, ora complacente, aplacava enfim suas angústias ao deixar-lhes cingir com os braços incertos sua cintura desprotegida.
Louvava os corpos e ânimos puros, mas sabia que, no fundo, nem mesmo os mais morigerados estavam intactos.
Ainda não havia compreendido por que deixara a vida fácil para constituir família - ou talvez lhe faltasse a coragem para admitir: amara de fato aquele homem, nos primeiros instantes. Apenas não se conformava ainda em ter-se fixado naquele sentimento - ela, que se fixava em uma emoção tanto quanto um patinador no mesmo ponto do gelo! Durante toda a vida fora abelha, que se nutria de efímero pólen, muitas flores por dia. Duas vezes se fixara: uma, naquele amor; outra, neste amargo arrependimento.
Cansou-se, enfim. Quis liberar-se daquele enfado, voar novamente de experiência em experiência; mas deixara-se perder as asas. Abriu as janelas, nem pensou, só restava uma liberdade.